31 de março de 2014

Tempos modernos

Demasiadas vezes se fala na morte do cinema e não tantas como se deveria do seu futuro. Ontem, no início de dois filmes de Charlie Chaplin no Teatro Nacional de São Carlos, os meus olhares mais insistentes nem foram para o que de magnífico acontecia no ecrã. Foram, de cabeça para trás e olhos para cima, em direcção à luz que saía de um projector no camarote presidencial que iluminava, na escuridão de um grandioso teatro, os olhares dos espectadores, dando a penumbra a uma sala onde se juntavam três a quatro gerações diferentes num movimento eterno em si mesmo. O que leva tantas pessoas e idades diferentes a uma sala onde se junta a mais dispendiosa arte cénica à mais precária das artes do movimento? É a vida, os seus sentimentos e as emoções que são as suas fontes. 

Enquanto formos vivos, esse olhar e esse desejo de nos comovermos continuarão a existir sempre. Felizmente, são os sentidos que nos comandam, fazendo-nos sentir que existe algo maior do que a nossa existência e que esse algo maior também nos pertence. E, por fim, que nos dão a ilusão de um movimento do tamanho dessa sala e da soma de idades que nela se juntou: maduro e inocente, curioso e grande, acolhendo o riso de cada criança para a tela da mesma maneira que acolhe os olhos comovidos dos adultos que sentem a sua inocência perdida. 

É isso o cinema: bonito e eterno, juntando-nos por aquilo que somos e sentimos, sem idade nem lugar para que se julgue aquilo que vivemos. E que nos faça sentir que a vida nunca termina quando os olhos se abrem a ela.

26 de março de 2014

"Lorsque j'étais petit garçon... je remonte loin dans mon enfance. L'enfance, ce grand territoire d'où chacun est sorti! D'où suis-je? Je suis de mon enfance. Je suis de mon enfance comme d'un pays."

(Antoine de Saint-Exupéry, Pilote de guerre)

19 de março de 2014

Cumplicidades silenciosas em todas as vidas

"(...) sentia o insaciável desejo dos artistas, que é encontrar encorajamentos em todas as bocas, admiração em todos os olhares, cumplicidades silenciosas em todas as vidas (...)"

Élie Faure, Paul Cézanne

15 de março de 2014

"Oui, cette librairie n'a pas été simplement un refuge mais aussi une étape dans ma vie. J'y restais souvent jusqu'à l'heure de la fermeture. Une chaise était placée près des rayonnages ou plutôt un grand escabeau. Je m'y asseyais pour feuilleter les livres et les albums illustrées. Je me demandais s'il se rendait compte de ma présence. Au bout de quelques jours, sans interrompre sa lecture, il me disait une phrase, toujours la même: "Alors, vous trouvez votre bonheur?" Plus tard, quelqu'un m'a déclaré avec beaucoup d'assurance que la seule chose dont on ne peut pas se souvenir c'est le timbre des voix. Pourtant, encore aujourd'hui, au cours de mes nuits d'insomnie, j'entends souvent la voix à l'accent parisien - celui des rues en pente - me dire: "Alors, vous trouvez votre bonheur?" Et cette phrase n'a rien perdu de sa gentillesse et de son mystère."

Patrick Modiano, Dans le café de la jeunesse perdue